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O Conceito

O inventário cultural do projeto Travessias da Memória Transatlântica tem como tarefa explicar a cultura transcendendo os clichês publicitários, os estereótipos e os lugares comuns dos roteiros turísticos.

Para ir além do mero conteúdo descritivo de lugares e práticas culturais captados em atrativas imagens fotográficas, entendemos ser crucial mostrar que para explicar a cultura – no caso em questão, a cultura açoriana, é necessário analisar os seus fundamentos e os seus modos de ser. É preciso investigar suas recorrências e referências tomando como paradigma o seu produto cultural mais antigo e mais genuíno: a literatura.

Neste sentido, convém observar a tese defendida pelo professor Martins Garcia em seu livro inspirador intitulado: Para uma literatura açoriana.
No livro em questão, Martins Garcia afirma que a “açorianidade cultural” está enraizada na literatura açoriana e não o contrário:
(…) “não necessitamos de qualquer substância pré-determinada para que exista uma literatura açoriana. A cultura açoriana é que necessita de extrair das obras literárias as características aptas a reelaboração do conceito de Açorianidade lato sensu”.

Seguindo a referida tese, busquei analisar textos de autores que representam a tão evocada “açorianidade” enquanto mundividência característica dos Açores.

Para além da investigação teórica, desenvolvo pesquisas de campo através dos registos de depoimentos gravados em formato vídeo digital.

Recorrendo aos depoimentos, pretendo explicitar diversos pontos de vista sobre o complexo fenómeno da memória e da representação da identidade cultural açoriana ao articular a teoria filosófica da memória com as narrativas das histórias individuais e coletivas.

Outra vertente da minha pesquisa de campo abarca os workshops itinerantes que, durante os últimos três anos, apresentei em escolas, museus e bibliotecas das nove ilhas do arquipélago. Os workshops derivam de projetos que foram aprovados e financiados em concursos promovidos pelo Governo Regional e, enquanto prática cultural itinerante, fortalecem a tríade investigação-formação-cidadania ao estimular novas perceções em relação ao património histórico e cultural dos Açores.

Uma espécie de embriaguez do isolamento impregna a alma e os atos de todo o ilhéu, estrutura-lhe o espírito e procura uma fórmula quase religiosa de convívio com quem não teve a fortuna de nascer, como o lógos, na água. Daqui partiria o fio das reflexões que me agradaria desenvolver.
(Vitorino Nemésio – Açorianidade)